Aversão a risco e necessidade de recursos para a reconstrução do país podem levar à retirada de dólares e ienes do Brasil
Aline Cury Zampieri e Olívia Alonso, iG São Paulo
15/03/2011 05:44
A tragédia no Japão tende a provocar uma valorização do dólar no Brasil no curto prazo. Segundo economistas, duas lógicas entram nessa conta. Na primeira, problemas dessa magnitude tradicionalmente provocam aversão a risco e fuga de capitais de países emergentes, como o Brasil, para os desenvolvidos, como os Estados Unidos. Na segunda, o medo com relação ao futuro pode fazer com que japoneses levem de volta para casa parte do capital que possuem em outros mercados.Henrique Santos, economista-chefe da Ativa Corretora, conta que na aversão a risco, a fuga de capitais de países emergentes para economias tidas como mais seguras aumentaria a procura por dólares, o que provoca a desvalorização do real na comparação com a moeda norte-americana. A situação também faz com que economistas descartem aplicações de grandes fundos de pensão mundiais em países que não tenham chancela de grau de investimento por agências de risco, ou seja, estejam quase livres de ameaças.
“Embora o País tenha melhorado sua classificação de investimento, não é natural que os recursos sejam migrados de um país seguro – como o Japão – para um emergente – como o Brasil”, diz Daniel Motta, professor de economia do Insper. Em geral, segundo ele, se os investidores quiserem realocar seu capital, buscarão um destino com as mesmas características do ambiente anterior. “Pode ser que saiam do Japão para os Estados Unidos, por exemplo.”
No caso da tendência de retorno de recursos, diz José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator, o medo com relação ao futuro e à desvalorização de investimentos tende a fazer com que muitos japoneses residentes no país ou no exterior repatriem ienes aplicados em outros países, para se proteger ou investir na reconstrução das áreas afetadas. Isso diminuiria operações financeiras de carry trade no Brasil, que são aplicações nas quais se toma dinheiro a uma taxa de juros em um país para depois aplicá-lo em outra moeda, onde as taxas de juros são maiores. “Com esses problemas, parte do dinheiro que vinha para o Brasil procurando as taxas mais altas retorna ao país de origem pois, num primeiro momento, assume-se que os japoneses vão precisar de seu dinheiro para proteção e recuperação do país”, afirma.
Nem mesmo os altos juros pagos pelo Brasil deverão atrair os recursos até então alocados no Japão, segundo os economistas. “Uma pequeníssima parte do portfólio até poderia vir para cá, caso o investidor queira uma rentabilidade maior. Mas se ele investe no Japão, que tem juro baixo e pouco risco, apesar de todos os problemas, é mais provável que ele não queira correr o ‘risco Brasil’”, diz Celso Grisi, professor de Economia da Universidade de São Paulo (USP) e diretor do instituto de pesquisas Fractal.
Neutralizadores
Ambos os conceitos, no entanto, embutem atualmente possibilidades atenuantes. No caso da aversão a risco, o economista-chefe da Ativa lembra que o dólar teve comportamento diferente do tradicional durante as crises recentes no Oriente Médio e na África. “O voo para a qualidade, de busca de dinheiro teoricamente mais seguro em países desenvolvidos, não aconteceu nas últimas crises. O dólar não se valorizou na comparação com o real.” Ele diz que a questão ainda não pode ser tomada como padrão, pois foi pontual, mas esse comportamento poderia indicar que mercados antes considerados seguros perderam um pouco de sua força atrativa.
A segunda atenuante diz respeito à atitude do governo japonês de anunciar a injeção de dinheiro no país, que pode servir como neutralizadora da tendência de repatriação de ienes. O Banco do Japão (BOJ) planeja oferecer trilhões de ienes (dezenas de bilhões de dólares) ao mercado monetário, em uma operação de emergência destinada a debelar o nervosismo do mercado após um forte terremoto e tsunami atingiram o nordeste do país, informou a agência de notícias Jiji. Esse efeito apaziguador já teria sido sentido no câmbio de segunda-feira, que não se valorizou (o dólar caiu 0,24% na comparação com o real na segunda-feira). Injetando dinheiro na economia, o governo diminui a necessidade de repatriação de recursos.
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