Uma crise financeira é como uma derrapagem numa curva, só depois que acontece sabemos como poderíamos evitá-la.
Acrescente-se a isso a percepção que assistimos a tudo lentamente.
Um pouco antes da curva fica claro que deveríamos ter freado, reduzido a velocidade. Mas dentro da curva as ações são diferentes do que o raciocínio instintivo indica: não freie e não gire o volante na direção da curva (exatamente o oposto que todo mundo faz...)
O bom piloto cede à força centrípeta e gira o volante a favor da inércia e aos poucos reduz a velocidade (no câmbio). Isto permite retomar a aderência e fazer a curva. (Evidente que o certo seria evitar a derrapagem, mas uma vez que você está em meio a ela, o melhor é pensar numa estratégia para reduzir seus possíveis impactos negativos...)
A curva apresenta um paradoxo: no início da derrapagem devemos intensificar as condições que a geraram. Na crise é o mesmo: as condições que geraram a crise 2008 (juros baixos e liquidez) foram exacerbadas (pelos governos) justamente para mitigar seus efeitos. É como dar água para afogado: o senso comum não o faria. Entretanto a analogia é outra: a água doce para quem foi salvo no mar, ajuda a baixar a concentração de sal no sangue.
No caso dos EUA Ben Bernanke - o presidente do BC americano - e um dos maiores especialistas da crise de 29, sabia disso. Ele foi contundente: “Se precisarmos jogar dinheiro de helicóptero, isso será feito”. Quase foi necessário, mas felizmente o choque de liquidez recuperou o paciente.
No caso do Brasil foi gerada liquidez com várias ações: baixa de juros, redução dos compulsórios e queda de impostos. Mas é preciso uma boa gestão para saber retirar estes incentivos com prudência e na sequência correta. Muita liquidez pode gerar inflação, pouca liquidez pode gerar desemprego.
Um pé no freio, o outro na embreagem e a mão no câmbio mudando as marchas. (Poderíamos também fazer uma analogia do câmbio do motor com o câmbio de moedas, mas aí seria tema para um artigo do Prof. Grisi).
Evidente que nem o melhor piloto do mundo consegue fazer uma curva se a velocidade de entrada for excessiva ou se a curva for negativa (o piso tem inclinação a favor da força centrípeta). É nesse momento que os passageiros se perguntam: o piloto vai conseguir fazer a curva?
A metáfora guarda incríveis semelhanças com a crise atual:
1) A velocidade de entrada foi acima do limite?2) O piso é inclinado a favor da curva, ou seja, as estruturas financeiras podem induzir uma nova crise?
3) Temos um piloto suficientemente hábil para ceder e depois se opor à força centrípeta? Ou os responsáveis pelo sistema financeiro sabem o momento certo para reduzir os incentivos monetários (juros e emissão de moeda) e fiscais (redução de impostos)?As respostas para estas perguntas não são definitivas (nem fáceis), pois ainda não saímos da crise.
Para o Brasil podemos responder para as três questões (com um otimismo responsável) que:
a) Estávamos longe do limite, principalmente no índice -crédito disponível / PIB - que estava na ordem de 40%;
b) Estruturalmente estávamos com dívida interna e externa sobre controle, embora no pós-crise os déficits públicos aumentaram muito, principalmente com gastos correntes (salários e manutenção da máquina pública). Nosso sistema financeiro é um dos mais sólidos no mudo e é referência para países como EUA e Inglaterra;
c) As respostas fiscais e monetárias para a crise no Brasil foram responsáveis e não permitiram um aprofundamento da crise.
Entretanto o Brasil não é uma ilha e as surpresas que aparecem mês a mês no exterior (Dubai, Grécia e Espanha) mostram que sabemos pouco sobre as reais condições do sistema financeiro mundial. Sobressaltos continuarão a existir ao longo de 2010.(Parece que estamos na RIO -SANTOS: uma surpresa a cada curva).
As crises e as curvas são ótimas oportunidades para fazermos ultrapassagem, pois nessas condições abrem-se janelas que permitem avanços.
Entretanto precisaremos ter carro, pneu, suspensão e piloto ótimos para conseguirmos algumas posições na corrida.
Tarefa desafiadora, pois além de tudo isso precisamos torcer para que não tenham jogado óleo na pista...
COLABORAÇÃO do Prof Ramiro Gonçalez- FIA
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