O paradoxo do medo
De tudo que se possa pensar, a recessão norte-americana parece certa.
Não foi a toa que o Fed, o Banco Central dos Estados Unidos, anunciou após a
reunião do último dia 9 que a taxa básica de juros permaneceria estável até a
metade de 2.013. Cogitou, no mesmo
comunicado, medidas adicionais de estímulo à economia do país. O mercado
passou a esperar por um novo Q. O terceiro, em menos de dois anos.Aumentar a liquidez dessa vez pode desembocar na aceleração dos preços e conduzir o país à situação ainda mais difícil, a estagflação. Nas iniciativas anteriores, as compras de ativos pelo Banco Central foram feitas na expectativa de induzir o aumento da demanda interna, enquanto os riscos de um processo inflacionário podiam ser deixados à margem. A inflação, observado apenas o núcleo do deflator do consumo, chega aos 1,5%, e apresenta-se em alta. Diferentemente de 2010, quando o mesmo indicador registrou para a inflação apenas 0,9%, tendendo a cair nos períodos seguintes. Era possível imaginar no ano anterior que com a ampliação da liquidez, os preços dos ativos pudessem crescer junto com a demanda, sem produzir impactos expressivos no sistema de preços. De quebra, o enfraquecimento do dólar contribuiria para a redução do déficit externo do país.
Dos três planos de expansão da liquidez ficaram poucas e duras lições. Comprar ativos do mercado não se traduz em aumentos significativos da demanda. Beneficia falidos. Não produz aumento relevante no nível de emprego. Não gera aumento da renda.
O aprofundamento da recessão já foi assumido pelos agentes econômicos. O número de trabalhadores que entraram a primeira vez com pedidos de seguro desemprego cresceu acima de 400 mil, na semana encerrada em 13 de julho, apontando que as demissões superaram as contratações. As vendas de imóveis residenciais usados caíram 3,5% no mês de julho, até agora o menor nível desse ano. Por consequência, o preço médio desses imóveis recuou 4,4% nesse mês. Em linha com os maus resultados da economia, o índice de atividade industrial do Federal Reserve da Filadélfia também se apresentou em forte queda. De 3,2 em julho, o índice veio para -30,7 no mês de agosto. E para fechar o quadro das restrições a qualquer intenção de ampliação da liquidez, o índice de preços ao consumidor, conhecido por CPI, cresceu 0,5% em julho, contra 0,2% em junho, mostrando inesperadas pressões altistas nos preços. Comparado com julho de 2010, o avanço nos preços medidos pelo CIP é de 3,6%. Aumento que assombra, depois da continuada recessão do período.
A tudo isso o mercado reage de forma contraditória. A alta do ouro e de outras commodities metálicas evidencia o temor dos investidores. Todas as barreiras técnicas dessas matérias primas foram rompidas e ainda assim nada, sinaliza para o arrefecimento de seus preços no curto ou médio prazo. O rendimento dos títulos de 10 anos do Tesouro Americano já está menor de 2%. Rebaixada a nota de risco da dívida dos Estados Unidos, os papéis que a representam têm a procura aumentada. É o paradoxo medo. Uma vertente econômica da síndrome de Estocolmo.
Parece prudente abandonar as estratégias de liquidez exacerbada e iniciar uma nova tentativa pelo lado dos investimentos. O presidente Obama, anuncia sua intenção de estimular a geração de empregos por meio da ampliação dos investimentos em obras de infraestrutura, acompanhado da criação de um banco financiador para os investidores privados. Parece lógico e pode trazer resultados melhores para a população norte-americana.
Com o PIB decepcionante, instabilidade política e déficits gêmeos tão grandes os Estados Unidos estão mesmo fora de combate. A União Europeia vai ter que dar conta de suas impagáveis dívidas soberanas sozinha. O crescimento mundial está, portanto, comprometido.
A recessão é uma certeza. Não há motivos para euforias, nem para pânicos.
O paradoxo do medo volta a presidir as decisões: o medo encoraja os investidores a assumir os riscos dos mercados, porque simples anúncios de planos os tornam seguros e prósperos. E tudo recomeça, com ímpeto renovado, esquecida a recessão como uma realidade inexorável, as forças e as contradições do mercado entram em ação.
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